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Ciência & Saúde Coletiva – Julho de 2019


No editorial deste número temático sobre nutrição, a professora Inês Rugani Ribeiro de Castro, do GT Alimentação e Nutrição da Abrasco, chama atenção para uma tríade de elementos que conforma uma sindemia global: obesidade, desnutrição e mudanças climáticas. Ressalta-se que os sistemas alimentares fazem a síntese dessa tríade, pois eles se compõem de cadeias de produção, de comercialização dos produtos, dos ambientes em que são produzidos e das práticas alimentares. O contexto físico, econômico, sociocultural e o acesso aos alimentos são os mediadores do estado nutricional e da saúde.

Neste texto não se fala de um projeto paroquial. Hoje os esforços são globais em torno do tema da segurança alimentar. No entanto, esses esforços têm sido muito pouco efetivos para conter o agravamento da desnutrição e da obesidade por vários motivos: forte oposição do setor privado que produz alimentos processados, inépcia na implementação de políticas públicas que ferem interesses econômicos poderosos; pouco interesse ou falta de liderança dos gestores para implementar medidas efetivas; e insuficiente pressão da sociedade civil para exigir mudanças a favor do ambiente e da produção de alimentos saudáveis2.

O caso do Brasil é exemplar tanto no esforço de formular políticas propositivas como na pouca efetividade com que são implementadas3. Até os anos 1990, o país tinha percentuais elevados da população com desnutrição de grave a leve. Esse drama foi vencido. Nos últimos anos, houve um aumento acelerado da obesidade em todas as faixas de idade e de renda. A prática nutricional acabou por aproximar desnutrição e a obesidade. São exemplos: a introdução precoce de produtos ultraprocessados na alimentação de crianças na primeira infância4; o massivo consumo de alimentos preditores de risco cardiovascular5; e barreiras socioeconômicas e culturais ao consumo de frutas e verduras6.

O enfrentamento dos problemas citados vem sendo assumido pelo Governo Federal desde 2003, em particular, por meio de estratégias contra a fome e a miséria. A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) tornou-se uma política de Estado que definiu os marcos legais e institucionais da agenda, com a criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN); a recriação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA); a instalação da Câmara Intersetorial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN); e a elaboração do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN 2012/2015). http://mds.gov.br/assuntos/seguranca-alimentar/direito-a-alimentacao/sistema-nacional-de-seguranca-alimentar-e-nutricional-sisan Os diversos dispositivos levam em conta as questões da desnutrição e da obesidade de forma articulada e convergente, com mecanismos de governança e compromisso de governantes em fazer avançar essa agenda. Embora não se possa atribuir uma causa apenas a qualquer fenômeno, pode-se dizer que há uma associação entre a melhoria nos indicadores de pobreza e a diminuição da insegurança alimentar no país.

Entretanto, a crise econômica e política que assola o Brasil desde 2016 pode reverter os indicadores de sucesso, particularmente, os relativos à desnutrição. E nunca se deve esquecer que, a despeito da crise ou aproveitando-se dela, a indústria de alimentos ultraprocessados continua próspera, florescente e encantando crianças e adultos incautos para os efeitos daquilo que comem e bebem na sua saúde.

FONTE: https://www.abrasco.org.br/site/revistas/ciencia-saude-coletiva/ciencia-saude-coletiva-julho-de-2019/42102/

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