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ONU dá início à Década da Agricultura Familiar


A agricultura familiar no Brasil está bastante ligada à economia solidária. Pequenos agricultores e agricultoras costumam se unir em grupos e cooperativas para vender o alimento produzido.

É da agricultura familiar que vem a maior parte do que os brasileiros consomem em suas refeições. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 70% do que consumimos é produzido por ela. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) estima que, no mundo, esse percentual chegue a 80%.

A vida de quem vive na lida da terra não é das mais fáceis. Por isso, políticas públicas que apoiem a agricultura familiar são muito importantes para garantir a comercialização e a geração de renda justa a esses agricultores. Seja garantindo a compra de itens para a merenda escolar, promovendo feiras e valorizando a produção familiar, é importante que se reconheça a importância dessa produção para a alimentação do brasileiro.

A FAO lançou, em 29 de maio último, a Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar. A presidente da Assembleia Geral da ONU, Maria Fernanda Espinosa, revela que a intenção é aumentar a conscientização pública sobre o papel que os agricultores familiares – muitos dos quais são mulheres e jovens – desempenham na sociedade e na economia. É também uma oportunidade para a adoção de políticas de apoio à agricultura familiar sustentável e diversificada e para o avanço na direção de novos paradigmas para sistemas alimentares e desenvolvimento rural.

Os agricultores familiares são também essenciais para cuidar da biodiversidade e do conhecimento tradicional. “De pastores a povos indígenas, de moradores da floresta a agricultores familiares, todos dão uma contribuição crucial para a Agenda 2030 que promove o Desenvolvimento Sustentável”, afirma Maria Fernanda.

Iniciativas de valorização da agricultura familiar

Algumas iniciativas, com as quais tive contato nos últimos anos, são destacáveis em termos de valorização dessa agricultura e estreitamento do contato dos produtores familiares com o consumidor final. E também na manutenção da biodiversidade e da cultura alimentar.

A Cooperapas, cooperativa baseada no extremo sul de São Paulo, é um desses grupos que produzem e comercializam alimentos em feiras (na região do Parque Ibirapuera e no Parque Burle Marx) e eventos, e começou inclusive a fornecer itens para a alimentação escolar municipal. A valorização do modo de vida rural também é uma das iniciativas da cooperativa, que criou, com parceiros, o programa Acolhendo em Parelheiros. Grupos escolares são os mais assíduos no programa, que possibilita conhecer o dia a dia desses agricultores e agricultoras, colher o alimento direto da terra, comer uma refeição preparada por eles e ainda levar para casa hortaliças e verduras orgânicas.

Na mesma região, um trabalho de resgate das raízes alimentares dos Guarani M’bya vem sendo desenvolvido no território Tenondé-Porã. Jerá Guarani, liderança indígena da região, iniciou um trabalho de plantação de sementes dos alimentos tradicionalmente cultivados pelos Guarani: mais de 50 tipos de batata doce, cerca de seis variedades de milho, algumas espécies de abóbora e amendoim. O Programa Aldeias, parceria entre o Centro de Trabalho Indigenista, a Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo e as comunidades Guarani do município, lançou no ano passado o livro Ara Pyau, que retrata os saberes do povo Guarani envolvendo hábitos alimentares tradicionais e plantio. Escrito na língua Guarani, é voltado às comunidades como forma de registro e valorização dessa cultura.

O Canal Futura produziu um episódio sobre a experiência de Jerá e dos Guarani no extremo sul de São Paulo para o programa Bela Raízes, onde é possível conhecer um pouco mais sobre isso.

Ainda em São Paulo, iniciativas como o Instituto Feira Livre, o Instituto Chão, além de cestas semanais de alimentos promovem, também, a aproximação do consumidor com o agricultor e praticam o preço justo, remunerando melhor os produtores. A Feira de orgânicos do parque da Água Branca é pioneira também na promoção dessa relação.

Longe de São Paulo, em Manaus, um negócio de impacto empreendido por jovens conecta agricultores familiares diretamente aos consumidores por meio de uma plataforma, ampliando a renda média dos campesinos.

“A Onisafra é uma plataforma que gerencia a conexão dos agricultores com o consumidor final e possibilita também a criação de multilojas. Qualquer grupo de agricultores ou organizações que ajudam agricultores podem criar sua própria loja dentro da nossa plataforma, e o consumidor consegue comprar diretamente deles”, define Macaulay Souza de Oliveira, um dos criadores do negócio. Com os resultados obtidos até agora, ele avalia que o potencial para aumentar o faturamento dos agricultores é de cerca de 30%.

Uma outra plataforma de dinâmica semelhante é o Sumá, baseado em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. A diferença é que ela conecta cooperativas e associações de agricultores a grandes empresas interessadas em comprar alimento fresco praticando o comércio justo.

Em Apuí, no estado do Amazonas, um grupo de colonos resgata a floresta cultivando café agroflorestal de variedade 100% amazônica, orgânico, em trabalho incentivado e suportado pelo Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam). O café Apuí já é vendido inclusive em São Paulo. Em breve trarei mais informações sobre isso, aqui, no meu blog.

No Mato Grosso do Sul, a Associação dos Produtores de Orgânicos do Mato Grosso do Sul (APOMS) busca tornar a agricultura familiar sustentável por meio de processos agroecológicos e fortalecer os laços de solidariedade entre os elos da cadeia produtiva. A Associação é composta por pequenos agricultores familiares, assentados de reforma agrária, populações quilombolas, indígenas e jovens da zona rural, unidos pela produção e comercialização de produtos agrícolas sob os princípios de agroecologia, produção orgânica e comércio justo. São 160 famílias em 12 municípios no entorno da cidade de Dourados. O principal bioma local é o Cerrado.

No Rio de Janeiro, a Junta Local promove feiras como ponto de encontro de uma comunidade que se mobiliza em torno da comida, ocupando o espaço público de modo festivo e valorizando a comida local e justa. A proposta é tornar visíveis as pessoas que produzem a comida que comemos, ao mesmo tempo em que valoriza o que é cultivado e produzido localmente, colocando pessoas e valores no centro do sistema alimentar. Para isso, além de feiras físicas, a Junta Local criou também a Sacola Virtual. As duas são plataformas que permitem conhecer e comprar diretamente de pequenos produtores, proporcionando acesso à comida boa, local e justa.

Não podia deixar de fora dessa pequena lista o Armazém do Campo, iniciativa que conecta a produção dos assentamentos do MST ao consumidor na cidade. Com lojas em São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre, o Armazém reúne uma gama variada de produtos como hortaliças, feijão, arroz, café, cervejas e muitos outros itens produzidos pelo Movimento. É do MST a maior produção de arroz orgânico da América Latina.

Essas são apenas algumas das iniciativas que conheci ao longo dos últimos anos, e sobre as quais já escrevi aqui no Conexão Planeta com mais detalhes. Reuni-las nesse post me fez ver como esse é um caminho que vem sendo trilhado em muitas regiões do Brasil. Com certeza, existem muitas outras país afora. É momento de valorizarmos e fomentarmos essa valorização da agricultura familiar.

Meu post de hoje é um convite a encontrar essas iniciativas e colaborar com agricultores e agricultoras que cultivam o alimento que vai para as nossas mesas. E claro, também um alerta para cobrarmos políticas públicas para esses produtores.

Com informações da FAO/ONU

Foto: Gabriel Jimenez/Unsplash

Texto tirado do site : http://conexaoplaneta.com.br/blog/onu-da-inicio-a-decada-da-agricultura-familiar/

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